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Confiança: a chave para o sucesso

Atualizado: 29 de set. de 2023


Confiança: a chave para o sucesso (Dr Felipe Vigarinho - Neurologista em Jundiaí)
Imagem obtida por IA - https://designer.microsoft.com/

Imagine a seguinte situação: você viajou a um país distante, e perdeu-se do grupo no meio de uma trilha. Está há algumas horas rodando sem rumo, e já não tem a menor noção do lugar onde se encontra. O pôr-do-sol está próximo, e logo vai escurecer, e você precisa dar um jeito de sair desse local. De repente, um milagre acontece: aparecem 2 homens bem distintos no seu caminho. Um deles é bastante simpático, comunica-se bem, usa vestimentas apropriadas e tem boa aparência geral. O outro é meio rude, não faz muito contato visual, parece não prezar pela aparência, não mostra querer ajudar muito, e usa roupas bem surradas. Ambos te orientam uma saída, mas com caminhos completamente opostos – em qual deles você confiaria a sua vida?



A resposta para essa pergunta é quase universal: a grande maioria de nós possivelmente confiaria no primeiro homem. E não sou eu que estou dizendo, são estudos de comportamento humano e neuropsicologia. Fatores como cordialidade, carisma, disposição a ajudar, e aparência dentro dos padrões que prezamos são essenciais para estabelecer uma relação de confiança, mesmo que à primeira vista. E o ser-humano, como ser social, busca o tempo todo por relações confiáveis, sendo esse um fator determinante para o seu interesse, em todos os ambientes – inclusive o corporativo.



Por esse motivo, tornou-se grande objeto de estudo a “Cultura de Confiança” em ambientes de trabalho. Nessa linha, uma famosa meta-análise feita em 2016 pela Gallup (empresa de pesquisas e consultoria norte-americana) mostrou que um elevado engajamento dos funcionários é diretamente proporcional à conexão que eles estabelecem com: a empresa (como entidade com propósito em comum), com o seu chefe e com os colegas de trabalho. E o pilar principal que estrutura essas relações é, sim, a Confiança. Por esse motivo, torna-se essencial ao sucesso de uma empresa ou de grupo de pessoas que se estabeleça um ambiente altamente confiável para todos.



A partir dessa constatação, muito tem se falado sobre como uma companhia consegue estruturar-se, de maneira orgânica, para proporcionar um ambiente de real confiança aos seus funcionários. Afinal, esse é o tipo de sentimento genuíno, que não se simula ou se maquia – não dá para “convencer” um indivíduo a confiar cegamente em algo apenas com palavras, insistência ou ações tangíveis. Nesse campo, as pequenas atitudes são muito mais claras, entrelinhas ganham mais valor que frases produzidas, e gestos pequenos por todos os cantos tornam-se gigantes, dos quais é bastante difícil ter controle.



Por isso, meu amigo, peço que se acomode bem na cadeira, e respire fundo, pois o que tenho a dizer a partir de agora não é nada simples de se executar, ainda que seja fundamental para qualquer ambiente corporativo.



O primeiro e mais estruturante passo, na busca por uma cultura de confiança, está lá nos primórdios da organização: o seu propósito. Os indivíduos buscam cada vez mais conectar os seus objetivos de vida com os da empresa, e quando há uma correspondência, quebra-se a barreira inicial de desconfiança. Se você busca, genuinamente, algo que a empresa irá ajudar a impulsionar, o seu trabalho começa a fazer muito sentido, entende? E, vejam, na minha opinião é essencial que os setores de RH tenham muito claro o propósito da empresa, e busquem incansavelmente por colaboradores alinhados – esse deveria ser o principal fator de eliminação nas contratações, pois grande parte dos outros critérios é treinável, mas esse não. E o desalinhamento à cultura resulta em desengajamento, até do indivíduo mais técnico e capaz para a função.



Superada a questão, e considerando empresa e colaboradores bem alinhados em propósito, outras habilidades tornam-se essenciais para estabelecer um ambiente de confiança e amplo engajamento (listo as mais importantes, na minha visão):


- Honestidade em todos os níveis e relações.

Líderes precisam trazer informações claras, objetivas, sem rodeios ou tentativas de fuga. Precisam estar próximos, e mostrar que confiam em seus liderados. Jamais devem subestimar ou tentar enganar os demais colaboradores, pelo motivo que houver. Um evento de escape pode ser suficiente para minar toda a relação, de maneira duradoura.


- Transparência.

É característica central em empresas de alto engajamento a transparência sobre assuntos importantes, do tipo, “onde queremos chegar e como planejamos fazer isso.” Expor de maneira clara aos colaboradores, especialmente de menor nível hierárquico, denota respeito e confiança neles para assimilar essa informação e executar o trabalho. Uma empresa e um líder que demonstram confiança no funcionário, rapidamente geram uma troca de confiança mútua partindo deste também. Ao passo que, reuniões fechadas e sigilos por todo o canto, têm o efeito contrário – ao excluir as pessoas do cenário, elas não se sentem pertencentes ao grupo, e perdem o propósito de construir.


- Compromisso na fala.

Uma característica central de todo líder é manter o que se propõe. Não tem coisa pior do que um chefe que promete algo, e depois volta atrás – às vezes colocando inclusive em dúvida o que se, indubitavelmente, fora dito. Por isso, deve-se tomar bastante cuidado com o que se leva ao liderado, e a maneira como isso é exposto, pois uma vez feito o compromisso, o não-cumprimento quebra de forma avassaladora toda a relação.


- Competência.

Funcionários competentes, que sabem como fazer e compartilham seus conhecimentos, são mais admirados. Assim também ocorre com a empresa. O sentimento de estar em um lugar, rodeado de pessoas tecnicamente boas, que conhecem o caminho e entregam muito bem, é essencial para estabelecer confiança. Se eu confio no trabalho realizado ao meu redor, também me comprometo a fazer de tudo para entregar.


Por fim, além das principais habilidades gerais necessárias, acho interessante trazer ainda mais clareza do assunto ao leitor que dedicou tempo para chegar até aqui. Para isso, remeto a décadas de pesquisa de um neurocientista que muito admiro, especialista no assunto (Paul Z. Jak) – autor de trabalhos nos quais destaca 8 sugestões práticas sobre o que fazer para construir uma Cultura Forte de Confiança Organizacional. Ao final do artigo, trago as referências completas, a quem se interessar.

1. Reconheça a excelência

Reconhecimento público de suas entregas gera um sentimento mútuo de gratidão e dever cumprido, estreira laços e ajuda a romper possíveis barreiras, que poderiam minar uma relação de confiança. Além disso, inspira os demais a almejarem a excelência, e coloca como possível estar naquele lugar de reconhecimento. Rituais formais de reconhecimento, cíclicos, costumam ser bastante efetivos – desde que justos.

2. Coloque desafios em grupo (claros e atingíveis)

Quando os membros da equipe precisam trabalhar juntos para alcançar uma meta, eles se mobilizam e estreitam laços, um prol do objetivo. Essa proximidade gera uma sensação de pertencimento, essencial para haver confiança. Mas só funciona se as metas forem claras e atingíveis; desafios impossíveis desengajam antes mesmo de começar.

3. Promova autonomia dirigida

Um líder mostra que confia em sua equipe quando não tem dificuldades para delegar, e dá autonomia suficiente para o liderado executar – à sua maneira, mas alinhado às estratégias centrais da empresa. Grandes respostas podem surgir quando o colaborador sente-se livre para a entrega (muitas vezes até caminhos diferentes do que imaginava o idealizador da ação). É importante haver uma rotina de rituais de atualização, nos quais o colaborador expõe ao líder status das ações, e busca direcionamento se for necessário (sem perder com isso sua liberdade para execução).

4. Permita que colaboradores escolham projetos

Funcionários que conseguem escolher um projeto, de forma autônoma, conseguem concentrar as suas energias naquilo que mais lhe interessa (às vezes, algo não transparente aos líderes). Dar essa oportunidade gera confiança e gratidão.

5. Compartilhe informações amplamente

Funcionários que são bem informados sobre detalhes dos projetos, e sobre objetivos e estratégias da empresa, sentem-se verdadeiros membros do grupo e construtores da história pretendida. Saber de informações importantes por outras pessoas, de maneira aleatória, gera um sentimento de absoluto distanciamento.

6. Construa relacionamentos no trabalho

Pode parecer contraditório, e acredito mesmo que muitas pessoas não concordem com essa visão do assunto. Mas diversos trabalhos de Jak mostram ser importante aos funcionários criarem laços verdadeiros com seus colegas de trabalho. A ideia de que trabalho não é lugar para fazer amigos está se tornando ultrapassada, pois quando pessoas passam a preocupar-se de fato umas com as outras, engajam-se mais facilmente, confiam e passam a não querer decepcionar seus colegas de equipe. Você pode ajudar o time a construir conexões sociais incentivando almoços, encontros depois do trabalho, e interações não-profissionais das mais diversas.

7. Facilite e estimule o crescimento de seus liderados, em todas as esferas

No ambiente corporativo, muito se fala no crescimento profissional de seus colaboradores. Para isso, é essencial que o líder estabeleça objetivos claros de desenvolvimento, dê autonomia e condições para alcançá-los e forneça feedbacks reais e consistentes. Entretanto, chefes que se preocupam também com o crescimento pessoal das pessoas, conseguem estreitar relações e gerar confiança de maneira mais orgânica. Para isso, discuta também sobre a integração trabalho-vida pessoal, e sobre família e tempo para recreação. Investir na pessoa como um todo tem um efeito poderoso no engajamento e na retenção.


8. Mostre vulnerabilidade

Eu já trouxe esse conceito em outros artigos, e reitero – é extremamente importante a um líder. Mostrar que você também possui limitações, e muitas vezes pedir ajuda, é um recurso eficaz para quebrar barreiras e estabelecer um vínculo de confiança. Pois deixa claro que somos todos iguais, gera empatia e explora o impulso humano natural de cooperar com os outros.


Referências:

  1. Chamorro-Premuzic T. Confidence: How Much You Really Need and How to Get It. 1st edition. Plume, 2014.

  2. Harter J (Gallup). Moneyball for Business: Employee Engagement Meta-Analysis. Workplace, 2016 - https://www.gallup.com/workplace/236468/moneyball-business-employee-engagement-meta-analysis.aspx

  3. Zak JP. Trust Factor: The Science of Creating High-Performance Companies. 2nd edition. Amacon, 2017.

 
 
 

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