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A Memória nos tempos modernos.

Atualizado: 29 de set. de 2023


A memória nos tempos modernos - Dr Felipe Vigarinho (Neurologista em Jundiaí)
Imagem btida por IA - https://designer.microsoft.com/

Em quase de 10 anos de consultório, poucas situações me chamaram tanto a atenção como a enorme prevalência de queixas de memória dos últimos anos. E o mais surpreendente: boa parte dos casos tem ocorrido com adultos jovens, e não com idosos. Trata-se de um cenário preocupante, que me faz refletir com frequência sobre como a nossa sociedade está doente.


Quando pensamos em doenças cerebrais que afetam a memória, certamente a primeira a ser lembrada é a Doença de Alzheimer. Ocorre que, na realidade, ela é o tipo mais prevalente de Demência, dentre outros, e somente uma entre as tantas condições que podem afetar a capacidade cognitiva. Tenho recebido pessoas jovens, sem histórico familiar de demências, aflitas com a possibilidade de ter Alzheimer – o que é muito curioso. Ao debruçar-se sobre as suas histórias, e ao se realizarem os testes cognitivos, quase invariavelmente a situação esclarece-se: percebemos prejuízo não da memória em si (o que às vezes ocore), mas sim da atenção. Surge então um segundo diagnóstico à mesa de consulta: “Nossa, então eu tenho TDAH?!”. Novamente, não.


Tenho visto pessoas levarem os seus cérebro até o extremo de esforço: trabalham 12h ou mais por dia, com pouca ou nenhuma pausa; não têm noites de sono reparadoras (pouco dormem, para falar a verdade); passam o dia resolvendo mais e mais problemas, preocupados, angustiados com os rumos de suas vidas – percebem que não está bom, mas não sabem como romper esse ciclo. Nesse cenário, meu amigo, não há encéfalo que aguente – o indivíduo trava ao tentar resgatar nomes/ situações/ definições; tem apagões de memória nos quais subitamente não sabe onde está, que dia é, o que foi fazer naquele local; passa horas e horas lendo a mesma tela do computador, e não progride na escrita. São todas demonstrações de esgotamento mental, sinais do seu cérebro dizendo para voltar aos eixos, porque não está bom.


Sinto dizer, mas esse ciclo de cansaço, insônia, muitas vezes com transtornos depressivos e/ou ansiosos associados, não é fácil de se romper. Pois exige da pessoa autoconsciência em primeiro lugar, e disposição para cuidar de si mesmo. É necessário mudar hábitos, preocupar-se mais com a alimentação, ter disciplina com a carga horária de trabalho, ter horário para ficar com a família, para divertir-se e para dormir com qualidade. Muitas vezes, entende-se que esse tipo de rotina não é compatível com a vida corporativa – e a pessoa precisa escolher entre a sua saúde e a carreira meticulosamente estruturada. Mas não deveria ser assim, concorda?


Ainda há muito o que fazer para que se entenda nas empresas que um funcionário esgotado rende muito menos, gera poucos resultados; e que Saúde Mental é sim estratégia de gestão de pessoas, e não somente campanha para o LinkedIN. Um ambiente de sobrecarga, com reunião atrás de reunião, e com cobrança em excesso sem os meios necessários para entregar, é a fórmula perfeita para inibir a criatividade, para reduzir a produção e para levar ao famoso burnout (que nada mais é que o fim da linha mesmo, quando o seu cérebro e a sua mente pedem basta).


Mas... gostaria de trazer aqui também um contraponto: a culpa do esgotamento, na minha visão, é muito mais do indivíduo do que da empresa. Sim, eu quis dizer exatamente isso que você leu e, acalme-se, vou explicar. O ambiente influencia muito na vida e na conduta das pessoas, disso não há dúvidas, mas cada um de nós também tem opções para seguir. Cada vez que deixamos de dizer não a uma nova demanda que não conseguimos absorver, de contrapor algo que não está legal, de mostrar para os outros que isso não vai funcionar, também estamos sendo coniventes. No começo, até gostamos da confiança depositada – queremos mostrar proatividade, que conseguimos entregar mais, até onde podemos chegar; e quando se percebe, já está em um abismo sem fim de esgotamento. A verdade, meus amigos, é que cabe a cada também um colocar os seus limites, e fazendo isso, gradativamente as pessoas ao seu redor também mudam. Óbvio que não podemos generalizar - existem locais e pessoas intolerantes, e indivíduos que precisam do trabalho, e aceitam as condições impostas por pura necessidade mesmo. Mas eu acredito que existem sim formas, mesmo nesses cenários, de colocar certas travas de segurança, que em primeiro momento podem até parecer que vão te limitar no crescimento de carreira, mas a longo prazo são elas que te manterão criativo, forte e produtivo para seguir em frente. E se o ambiente é tão restritivo, a ponto de você não conseguir ao menos opinar nessas situações, então acho realmente perigoso permanecer... eu tentaria outros meios.


Pois é, caro amigo. Não é uma reflexão fácil de se fazer. A virada de chave muitas vezes vem tarde, e aí que mora o perido. Você pode até estar achando que essa conversa não é com você, mas chegou até aqui no texto, parto do pressuposto que se identificou de alguma forma com o conteúdo. Por isso, eu gostaria de sair um pouco do campo da opinião (mesmo que embasada), e de te apresentar algumas sugestões de mudança de hábitos de vida que podem ser um divisor de águas na sua Saúde Mental. Além de impor os seus limites (algo já comentado), costumo sugerir aos pacientes 5 grandes ações:


1. Limite o tempo de telas.

Faça um teste: abra o seu celular agora e veja no contador quantas horas você o usou no dia de ontem. Surpreendente, não? Isso tudo é tempo perdido e um vício tão estimulante quanto cocaína para o seu sistema de recompensa cerebral.


2. Substitua redes sociais por interações verdadeiras.

Deixe as redes sociais um pouco de lado. Marque aquele jantar com os amigos, que sempre fica para quando der. Conheça pessoas novas, com opiniões e mentalidades diferentes. Saia com a família, divirta-se com pessoas queridas. As redes sociais refletem uma sociedade maquiada para ser bonita, o que leva a comparações pouco sadias para a sua saúde mental.

3. Dedique-se a dormir bem.

O cérebro trabalha com padrões. Tenha uma boa rotina de sono: vá dormir cedo e sempre no mesmo horário; leia um livro à meia-luz na cama (esqueça o celular nesse momento!); alimente-se com pelo menos 2 horas de antecedência ao ato de deitar; deixe um ambiente escuro, silencioso, propício para o descanso.

4. Alimente-se bem e pratique atividade física regular.

Os horários para alimentar-se e para exercitar-se são sagrados (ninguém mexe). Tenha ao menos 1 hora para cada refeição; coma frutas/ verduras/ peixes e carnes magras; beba pelo menos 2 litros de água todo dia. Faça a atividade física que te dá mais prazer, com regularidade, e sem pular dias.

5. Tenha propósito.

Procure identificar atividades que te estimulem a acordar cedo, aquilo que você faz e mal vê o tempo passar. Foque nesse tipo de coisa, para o trabalho (se possível) e para o seu tempo de distração. Saia da mesmice e da inércia, e dedique o seu tempo a atividades realmente gratificantes, àquilo pelo qual você quer ser lembrado – seu legado.

Pode parecer clichê, mas me arrisco a dizer que essas 5 atividades vão transformar a sua vida. De verdade. Dedique-se a isso, o quanto antes. Não espere o seu cérebro pedir descanso. Afinal, o nosso tempo aqui na Terra é tão curto para ser mal vivido... Concorda? Então, mexa-se enquanto há tempo!

 
 
 

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